Especialistas dizem que não há como prever os riscos, já que faltam estudos sobre o assunto; mesmo com o atraso, a orientação é tomar a vacina

Mais do que atrasar o calendário de vacinações contra a covid-19, a escassez da vacina coronavac traz incertezas sobre a eficácia para quem já recebeu a primeira dose do imunizante. Com o atraso na produção e envio das doses pelo Butantan, o intervalo entre as duas doses pode ser estendido. 

Com a mudança, o intervalo entre as doses, que hoje é de 28 a 30 dias, poderá ter um acréscimo de mais 14 dias. A informação foi passada pelo secretário de Saúde do Espírito Santo, Nésio Fernandes, em coletiva realizada nesta sexta-feira (23). 

“Entendemos que seria adequada a ampliação segura de, pelo menos, mais 14 dias para aplicação da segunda dose, caso os estudos técnicos consigam subsidiar essa situação. Isso ampliaria a aplicação da primeira dose e daria mais tempo para aquisição da segunda”, disse na ocasião.

Segundo Nésio, já há uma discussão entre a Anvisa, o Butantan e o Ministério da Saúde para estudar a possibilidade, já que nas próximas semanas pode haver um atraso na aplicação das doses, devido à falta de insumos no Butantan. 

Na noite de sábado (24), o secretário usou as redes sociais para reforçar o posicionamento. “A vacina é um imunizante poderoso, após aplicada não é um produto que se decompõe pela validade de dias. Até o presente momento a ampla maioria dos estudos reforçou vantagens na ampliação do prazo de aplicação entre doses”, afirmou, além de esclarecer outras questões sobre o assunto. 

Ampliação de prazo entre as doses traz muitas incertezas, dizem especialistas

De acordo com especialistas, ainda não há um estudo capaz de prever quais as consequências do atraso da segunda dose. “Não sei qual pode ser o efeito deste atraso com relação à resposta imunológica do paciente, e nem o fabricante tem essa resposta”, pontuou o professor e doutor em imunologia, Daniel Gomes.

Como faltam estudos, a orientação é seguir as recomendações do fabricante. “Precisamos seguir a bula do fabricante. É necessário seguir as recomendações porque foram feitos testes iniciais que mostraram que esse é o intervalo ideal”, explicou.

A pós-doutora em epidemiologia, Ethel Maciel, concorda. “Há poucos dados sobre um intervalo maior que 28 dias, então não temos evidências. Não temos dados que nos suportem para fazer uma janela maior”, disse.

“Mesmo com atraso, tome a vacina” 

Apesar das dúvidas, Ethel recomenda que as duas doses sejam aplicadas, mesmo que haja um intervalo maior que o recomendado. “Nós sabemos que é melhor, mesmo com atraso, você fazer o sistema completo do que a pessoa ficar com uma dose só. Como sabemos que a segunda dose é para manter a imunidade com mais tempo, é melhor que, mesmo com atraso de uma ou duas semanas, a imunização seja feita”, finalizou.

Faltam estudos, sobram riscos

Daniel Gomes explicou que, os efeitos podem ser negativos, positivos ou nenhum. “Sabemos que atrasos pequenos, de até 10 dias, não impactam na resposta imunológica do paciente, mas não é possível afirmar qual o impacto porque não há testes. Se o prazo for curto, pode ser que a primeira vacina não se perca, mas se o intervalo for maior, corre-se o risco de ser necessário repetir a primeira dose”, disse.

O especialista citou como exemplo os estudos feitos em outros imunizantes. “A Astrazeneca foi testada para intervalos maiores. Esticaram para três meses e viram que a resposta imunológica do paciente foi a mesma. Mas no caso da Coronavac nós não sabemos. É uma duvida que vamos ter sempre, tudo pode acontecer. Enquanto não houver estudos vamos sempre trabalhar na dúvida”, finalizou.

Expectativa de retomada na produção das vacinas

Durante a entrevista coletiva na sexta-feira, 23, o secretário afirmou que a expectativa é de que a produção das vacinas seja retomada ao longo da primeira quinzena de maio.

“Tivemos, por parte do Butantan, atraso na disponibilidade e na produção de doses, o que poderá acarretar uma suspensão dos envios de doses nas próximas três semanas. Esse assunto está sendo tratado pelo Conselho Nacional de Secretários e outros órgãos, para poder resultar em medidas seguras para preservar a execução do calendário de vacinas.”

Devido à produção, o número de doses da Coronavac que foi entregue ao Espírito Santo nesta sexta-feira foi bem menor em relação ao quantitativo antes recebido. Foram 13 mil doses enviadas pelo Butantan. Já da vacina Astrazeneca, da Fiocruz, foram 57 mil doses. 

Questionado sobre a possível ampliação do intervalo de aplicação entre as doses, o Instituto informou apenas que a bula da vacina “indica intervalo de 14 a 28 dias entre as doses” e que “o esquema vacinal é responsabilidade dos gestores”. Por nota, o Butantan ressaltou que para completar a imunização é importante a aplicação da segunda dose.

Nesta segunda-feira (26), o Butantan informou que as novas entregas de vacinas ao Programa Nacional de Imunizações do governo federal serão retomadas no dia 3 de maio. 

Fonte: Folha Vitória